O filme ‘Sempre’, de Luciana Fina, resgata imagens do cinema que acompanhou o processo revolucionário do 25 de Abril, juntando-lhes sons do momento histórico atual, aludindo à necessidade de “revolução permanente”, para a qual remete a “ambivalência do título”.
“Sempre” é retirado de “25 de Abril, Sempre”, a principal palavra de ordem saída da revolução dos Cravos, que se assinalou há 50 anos, celebração que motivou um convite da Cinemateca Portuguesa à realizadora italiana residente em Portugal há 30 anos.
Do convite inicial nasceu uma instalação artística, “Sempre — A palavra, o sonho e a poesia na rua”, que esteve patente até junho em Lisboa, e que posteriormente deu origem a este filme documental, feito a partir dos arquivos da Cinemateca, e que se estreará na 81.ª edição do Festival Internacional de Cinema de Veneza, na secção paralela “Dias dos Autores” (“Giornate degli Autori”), que vai decorrer de 28 de agosto a 07 de setembro.
Em entrevista à Lusa, a realizadora explicou que este é um filme em que acredita muito e o facto de ter tido “esta belíssima resposta do Festival de Veneza” e poder estrear na ‘Giornate degli Autori’ é, para ela, que é italiana, “uma grande satisfação e uma grande alegria”.
“É ao mesmo tempo levar comigo o melhor momento da História do país e levar comigo a História desse cinema e desse momento crucial para o cinema, e remeter também para o público italiano aquilo que é para mim uma intenção de fundo deste filme”, afirmou.
Luciana Fina refere-se a alertar para os problemas sociais que o país, mas também a Europa, atravessa e que põem em causa ou parecem esquecer os valores defendidos e conquistados com a revolução de Abril.
“Por isso este título, ‘Sempre’, tem uma ambivalência que claramente cita uma parte do slogan que conhecemos — ’25 de Abril, Sempre’ -, remetendo para uma ideia da revolução permanente, da emancipação da sociedade permanente”, do sonho de construir um futuro para o país e um país mais justo”, defendeu.
O filme resulta de um trabalho “muito desafiante” de montagem de “mais de 40 filmes escolhidos” a partir das imagens de cinema que acompanharam a preparação e o processo da revolução, e que convocam o confronto com a memória e a tentativa de gerir hoje os seus significados.
Luciana Fina evoca uma frase do realizador português Fernando Lopes, proferida numa entrevista em janeiro de 1974 — “No fundo era interessante que daqui a um ano a gente estivesse aqui a dizer que o que foi importante em 74 foi o cinema português” -, em que prefigurava o futuro do cinema, mas também a realidade que se concretizaria pouco tempo depois.
Com o 25 de Abril, muitos realizadores e documentaristas entraram em campo para observar e participar na mudança do país e nos ecrãs do cinema e da televisão começou a revelar-se tudo aquilo que vivia na invisibilidade.
A população, as suas vidas, as culturas rurais e operárias a assumirem um papel central, e o cinema a ganhar expressão entre a poesia, o cinema-direto, de intervenção ou de inspiração neorrealista, tudo isso está presente em “Sempre”.